A nossa publicação de hoje é motivada pela pergunta de um aluno:
“Professora, se a diferença entre o objeto direto e o objeto indireto está na preposição, por que esse negócio de objeto direto preposicionado não pode ser considerado um objeto indireto?”
Penso que a dúvida não é exclusivamente do meu aluno, sendo essa uma indagação frequente entre os estudantes da gramática da Língua Portuguesa.
Comecemos, então, por explicar que o objeto direto, seja ele preposicionado ou não, é o complemento de um verbo transitivo direto, de maneira que a existência ou não de uma preposição que o anteceda não alterará a predicação do verbo ao qual ele se vincula.
Assim, é a predicação do verbo que determina o tipo de complemento e não o contrário! Em outras palavras, se o verbo é transitivo direto (VTD), seu complemento será chamado de objeto direto (OD); se o verbo é transitivo indireto (VTI), seu complemento será chamado de objeto indireto (OI).
Eu amo você.
Amo = VTD
você = OD
Eu gosto de você.
gosto = VTI
de você = OI
Para saber mais sobre a predicação verbal, clique aqui.
O verbo transitivo direto, por sua natureza, não exige uma preposição no seu complemento. Acontece, no entanto, que em algumas situações haverá, com correção, a ocorrência de preposição introduzindo o objeto direto. Por quê?
Por várias razões, entre as quais estão:
1) O desejo de valorizar, no plano semântico, o objeto verbal:
Devemos louvar a Deus.
2) A ocorrência de objeto formado por pronomes oblíquos tônicos.
Ninguém entende a mim.
Todos adoram a ti.
3) O desejo de se evitar uma ambiguidade, sobretudo quando se tem:
3.1) inversão (objeto direto anteposto ao verbo)
A Abel matou Caim.
3.2) comparação
Estimo-o como a um pai.
4) A ocorrência de um objeto direto constituído pelo pronome relativo QUEM (nas orações subordinadas adjetivas). (Veja aqui a função sintática dos pronomes relativos)
Ele é o homem a quem eu amo.
5) A ocorrência de construções em que se coordenam, como objetos diretos, um pronome oblíquo átono e um substantivo.
Levei-o e ao irmão.
Vejam que, em todos os casos acima listados, embora o elemento sublinhado complete um verbo transitivo direto, que não exige preposição, ele vem precedido de uma preposição que ali é colocada por alguma razão estrutural ou intenção expressiva. Em todos esses casos ocorre, pois, o chamado objeto direto preposicionado, que, como vocês podem ver, não é um objeto indireto, uma vez que não completa verbo transitivo indireto!!!!
Há, ainda, um caso que precisa ser comentado. Trata-se de ocorrências que o mestre Bechara situa entre as preposições posvérbio, as quais correspondem a uma “preposição que, depois de certos verbos, mais serve para lhes acrescentar um novo matiz de significação do que para reger o complemento desses mesmos verbos“.
Assim, em casos como “Cumprir o dever” ou “Cumprir com o dever”, a preposição acentua a ideia de zelo presente na ação verbal, sendo uma preposição posvérbio. Em “Perguntei alguma coisa” X “Perguntei por alguma coisa”, o posvérbio acentua a noção de interesse prevista na semântica do verbo.
Outro exemplo seria “Comi o bolo” X “Comi do bolo”. A preposição (de), nessa ocorrência, indica que a ação verbal se processa sobre uma fração do objeto, como se o núcleo do objeto direto estivesse subentendido (“parte” do bolo).
Embora não sejam exatamente a mesma coisa, muitos manuais, em nome da didática, inserem as ocorrências de preposições posvérbio entre os casos de objetos diretos preposicionados.
Fique, agora, com um vídeo sobre o assunto:
Beijo grande e até a próxima!!!
Prof.ª Dr.ª Patrícia Corado
Cássio Pereira de Araujo
Postado 13:36h, 13 maioExcelente artigo, muito claro e objetivo.
Língua Minha
Postado 16:44h, 04 junhoObrigada pela sua visita e pelo seu comentário, Cássio! Um abraço
Ricardo Torres
Postado 21:29h, 24 junhoO certo é: “ele não entende ela” ou “ele não entende a ela”; “ele escolheu ela” ou “ele escolheu a ela”. Excelente artigo, nota 10!
Língua Minha
Postado 21:13h, 20 julhoComo os verbos são transitivos diretos, o melhor é que se use “ele não a entende” ou “ele a escolheu”. Caso se deseje usar a forma reta (“ele”, ou “ela”), a preposição será necessária e teremos, então, objetos diretos preposicionados.
Um abraço e obrigada pelo comentário e pela visita!
Patrícia
Bianca Campos
Postado 17:38h, 17 dezembroMuito informativo. Parabéns pelo trabalho!
Me restou uma dúvida:
Penso eu que a classificação ‘objeto direto preposicionado’ deve existir para embarcar as tantas anomalias, bem como finalidades, da nossa lingua – dado que verbos transitivos diretos, por definição, pedem objeto direto, i.e., o complemento não acompanhado de preposição. Penso também que essas ‘excessões à regra’ foram definidas historicamente, consagradas pelo uso e, por consequência, independentes da nossa vontade/escolha. Dito isso, me pergunto até que ponto podemos utilizar preposição para complementar verbos transitivos diretos. Imagino que uma lista de verbos que admite essa configuração não deve ser coisa fácil de se encontrar (eu procurei!) e uma explicação de quando isto é possivel também deve ser difícil formular devido a construção histórica da língua; tanto é que os casos acima, a princípio, não parecem seguir nenhum padrão. Estou certa? (risos)
Assim, resumo minha pergunta ao seguinte: O verbo saber, no sentido de ter conhecimento, pode vir acompanhado de preposição? Li que, sob este significado, esse verbo é classificado como v.t.d., mas, ao mesmo tempo, a oração ‘Eu sei da sua boa índole.’ soa correta pra mim. Este é um exemplo de quando a preposição é usada para valorizar o objeto verbal?
Abraço.
Língua Minha
Postado 20:38h, 30 dezembroBianca, não são exatamente certos verbos transitivos diretos que exigem (ou aceitam) o objeto direto preposicionado, é mais o objeto quem “pede” a precedência de uma preposição, ou em outros casos, como expliquei no artigo, recorre-se ao expediente do objeto direto preposicionado para que se desfaçam eventuais ambiguidades. O importante é reconhecer que não se trata de um objeto indireto porque a preposição não é, nesses casos, uma exigência do verbo. Quanto ao verbo “saber”, o caso é outro. Esse é um verbo que, a depender da aplicação, poderá ser transitivo direto (Ele não sabe o horário do voo), transitivo indireto (Eu não sabia dessa novidade) ou intransitivo (Como é estudioso, ele sempre sabe demais.).
Espero ter esclarecido a sua dúvida.
Um abraço,
Patrícia
Cesar Marcos Casaroto Filho
Postado 20:47h, 21 maioExcelente explicação! Muito obrigado!
Língua Minha
Postado 19:27h, 15 junhoObrigada pelo comentário, Cesar!
Um abraço!
Igor Alves
Postado 16:43h, 18 julhoSou um grande fã do seu trabalho e assisto sempre os seus vídeos no youtube, parabéns!! Gostaria de saber sobre essa “perguntas” que fazemos para saber a transitividade dos verbos… existe um padrão?
Língua Minha
Postado 20:39h, 18 outubroIgor, há “perguntas” que ajudam sim. Veja o artigo https://www.linguaminha.com.br/artigos/predicacao-verbal/.
Um abraço,
Patrícia
Caroline Morais
Postado 15:20h, 16 maioEu, que odiava português, hoje não vivo sem ele.
Obrigada por ser luz no caminho de tantos alunos.
Língua Minha
Postado 18:46h, 16 maioObrigada por todo o seu carinho, Carol! Amo você! Beijos