Retomo aqui a discussão que, após o impedimento definitivo da “presidenta” Dilma, parece ultrapassada… Faço-o, no entanto, motivada por pedido de uma leitora querida e pela atualização ganhada pelo tema em razão de uma declaração relativamente recente da Ministra Carmen Lúcia, a qual, após ser eleita para a presidência do Supremo Tribunal Federal, teria preferido a designação “presidente”, sob a alegação de ser “amante da Língua Portuguesa”.
Quero, encarecidamente, esclarecer que tratarei neste post de questão linguística e não de paixões políticas!
Então, vamos à formação da palavra: presidente é uma palavra formada pelo verbo “presidir” + o sufixo (formador de agente) “-nte”. Essa sufixação é bastante comum no nosso idioma, havendo um largo leque de exemplos: amar + -nte = amante; gerir + -nte = gerente; estudar + -nte = estudante; ouvir + -nte = ouvinte; governar + -nte = governante.
As palavras formadas com o sufixo “-nte” são, de maneira geral, “comuns de dois gêneros”. O que é isso? Palavras que servem tanto para o gênero masculino quanto para o feminino, havendo a flexão do gênero apenas nos determinantes que as acompanham (artigos e palavras de valor adjetivo).
Neste ponto, os adeptos à invariabilidade da forma “presidente” estão gritando: “Bingo!”.
É preciso notar, contudo, que há casos em que se faz, por razões variadas, a flexão de palavras que têm em sua composição o sufixo “-nte”. Exemplos disso são as formas “parenta” e “governanta”.
Se você agora está pensando que “governanta” não vale como exemplo pois designa uma função diferente da desempenhada pelo “governante”, digo exatamente o contrário: parece ser o exemplo mais cabal de que a língua traz em suas marcas reflexos dos comportamentos sociais. Assim, em uma sociedade em que os governos femininos se restringiam ao lar, sendo “ações menores para pessoas menores”, a língua se fez flexível e a possibilidade de variação de gênero de elemento linguístico formado pelo sufixo “-nte” foi posta em prática sem maiores estranhamentos, não é mesmo?
Ocorre na contemporaneidade fenômeno inverso. Não só no Brasil, mas no mundo! Nesse contexto, a marcação da presença feminina em funções historicamente negadas (veladamente ou não) às mulheres tem sido ratificada pelo uso de formas linguísticas no feminino. É o que acontece com a palavra “presidenta”, com o uso de “todos e todas”, de “brasileiros e brasileiras”. Veja que esses dois últimos exemplos são escolhas marcadamente ideológicas, uma vez que, gramaticalmente, “todos” e “brasileiros” incluiriam o masculino e o feminino.
Assim, conclui-se que tais opções, além de não representarem qualquer agressão à língua de que todos nós somos amantes, trazem em si um viés ideológico relacionado ao espaço feminino no mundo contemporâneo.
Para não haver mais discussão, é bom saber que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) registra a existência das duas formas: “presidente”, que serve para o masculino e para o feminino, e “presidenta”, específica para o feminino. Cabe a você escolher aquela que melhor traduz as suas orientações ideológicas! A língua, mãe generosa, oferece-nos as possibilidades…
Termino este post desejando que os debates sejam saudáveis e os argumentos sempre bem fundamentados!
Um afetuoso abraço!
Até a próxima!
Prof.ª Dr.ª Patrícia Corado
Maria Cecília
Postado 10:06h, 12 setembroBoa reflexão gramatical e política sobre o tema! A questão é muito mais ideológica do que da Língua Portuguesa!
Patrícia Corado
Postado 14:43h, 13 setembroConcordo, Cecília! Obrigada pelo seu comentário!
Beijos
Patricia
Postado 09:50h, 13 setembroSuper esclarecedora sua colocação. Vamos agora aguardar que aa pessoas entendem e respeitem a preferência do outro. Abraços.
Patricia
Postado 09:53h, 13 setembro*as pessoas entendam…
Patrícia Corado
Postado 14:45h, 13 setembroÉ verdade, Patrícia! Obrigada pela sua visita e pelo seu comentário. Fique sempre com o Língua Minha!
Abraço!
Bruna Ribeiro Araujo
Postado 12:15h, 13 setembroExcelente!!!
Patrícia Corado
Postado 14:47h, 13 setembroBruna linda!!!!! Obrigada pelo seu comentário!!!!
Beijos!!!!
Pedro Brandoff
Postado 13:01h, 13 setembroÓtimo texto. Muito bom mestra. Hahahaha
Patrícia Corado
Postado 14:49h, 13 setembroNossa!!!! Um elogio de Pedro Brandoff? Acho que vou emoldurar!!!! kkkk
Obrigada!!!!!!
Beijos!
Patrícia Corado
Postado 14:46h, 13 setembroÉ uma opção, Claudineia!
Ficamos muito felizes com a sua visita! Fique sempre com o Língua Minha!
Abraço!
Silvana Lima Tavares Cavalcanti
Postado 08:11h, 14 setembroEste tema me fez lembrar uma linda passagem do documentário sobre Saramago. Sua esposa, ao receber um jornalista e ser por ele chamada de presidente (de uma Fundação), segura-lhe o braço visivelmente irritada e diz, olhando – o nos olhos: “Meu caro, sou presidenta! A palavra nunca foi usada antes porque o cargo jamais fora ocupado por mulheres. Agora que isso é uma realidade que começa a se expandir, faço questão do feminino.” Grande abraço, linda mestra.
Patrícia Corado
Postado 12:22h, 14 setembroLindo comentário, Silvana!!!! Obrigada por nos honrar com a sua visita e com as suas palavras sempre preciosas!
Meu beijo cheio de carinho para você!!!!! Saudade!
Da sua sempre aluna,
Patrícia